quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Medo Primordial

Na verdade, acabei me enrolando no último post. Aquele era meu quarto conto posto no pc, mas o terceiro que escrevi no papel. Com esse daqui, se me lembro bem, foi o oposto: foi o quarto que escrevi, mas o terceiro que pus no computador. Lembro que guardei a idéia do texto por um bom tempo na cabeça, mas que não conseguia pôr no papel de jeito nenhum. Não conseguia achar o tom da história. Foi quando aconteceu uma agradável surpresa: surgiu o tema "Medo" no desafio de uma comunidade de quem participo, a "Escritor e sua sinopse". Não deu outra: a partir do tema do desafio, dividi a idéia no meio e fechei o conto. A outra metade, uma espécie de continuação, ainda espera pra ser posta no papel. Acho que foi com esse escrito a seguir que comecei a fazer mais experimentações, colocando referências meio ocultas (é um costume que venho desenvolvendo e é bem divertido) e focando mais na protagonista; mas ele não é perfeito, claro, e acho que a grande falha é o excesso de formalismo. Sorte que tenha melhorado nos últimos tempos.

Boa leitura!





Medo Primordial

Cabelos bateram-se contra o solo. Eram de Havah. Levantando lentamente os olhos após chocar-se contra o chão, ela pôde ver-se dentro de um imenso jardim, o qual conhecia muito bem. À sua frente, distinguiu um imponente rio e estendendo os olhos até o horizonte, pode vê-lo dividir-se em quatro afluentes, para irrigar todo o local. Observando as árvores de todo o tipo que ali brotavam, lembrou-se de como se deliciava com seus frutos de toda espécie. Forçando-se admirar a perfeição que rejeitara por tolice, a fêmea sofria. Lágrimas caíram-lhe dos olhos e doíam-lhe mais – bem mais – que as escoriações causadas pelo tropeço. O motivo do choro era uma queda maior.

Então, uma sensação estranha lhe percorreu o corpo, exigindo-lhe pôr as mãos no solo para apoiar-se. Era uma voz que lhe sibilava ao ouvido. A princípio, reconheceu-a como a do Senhor. “Não”, julgou posteriormente. De qualquer modo, não podia considerar-se exatamente errônea. Atrás de si, um ser superior a detinha. E murmurava, a princípio, exatamente como havia compreendido. Depois, levantou a voz. Não de um jeito imperioso, mas contrariado e - supunha ela - até um tanto triste. Quem falava era um mensageiro, acompanhado de cinco iguais, os quais estavam sob sua responsabilidade. Encontravam-se atrás de si e do homem que acompanhava Havah – seu esposo:

- Levanta-te, mãe de todos os viventes, pois eis que deste do fruto proibido àquele que foi feito do barro – ordenou o anjo, denunciando seu estado de espírito, ao embargar por vezes – Já não és mais digna de tocar este sagrado solo.

Havah cerrou o punho. O macho ao seu lado, porém, dedicou-lhe um olhar amansador, estendendo-lhe também uma das mãos. Apoiada nos músculos de Adam, aquela que nascera de suas costelas, readquiriu forças e prosseguiu no caminho.

Os dois – abraçados – caminharam ainda por mais algum tempo. Vigilantes, os querubins os seguiam. Apesar de todo o constrangimento, a mulher não sentia ódio do seres celestes. Sentia raiva. Raiva de si mesma por ter sido tão tola. E medo, muito medo, pelo que a esperava além do pequeno mundinho que conhecia. Aquele jardim, aquelas árvores, o rio e seus afluentes, eram tudo o que conhecia. Nada além disso. No entanto, por mais que se encontrasse desesperada, a mulher já estava calma o bastante para ponderar sobre a situação. Por mais doloroso que fosse, admitia que fora vítima de uma decisão justa, apesar de dura. “Que fiz eu? – se perguntava ela, a todo instante – Agora estou eu aqui, incapaz de resistir, forçada a fiar e a cavar a terra por ter rejeitado o que é imortal”.

Pranteou. Por vezes, ainda ouvia o som sibilante, mas não mais se permitia olhar para trás. Estava além de si. Forçava a mente como que para esquecer a voz e a pressionava para fora do pensamento, como se temesse uma alucinação, mas o ruído resistia. Dirigiu então o olhar ao esposo, que se esforçava para manter-se firme. Quando divisou o horizonte, observou o sol se pôr. Abaixo deste, as árvores cessavam sua existência. Era o fim da Terra da Estepe e o término da caminhada. O começo do sofrimento.

- Agora, lhes deixo aos cuidados do Oriente desértico – disse-lhe o chefe dos enviados – Já não mais gozareis do que é perfeitamente bom, nem vós nem vossa descendência, até que chegue a hora. As portas do Paraíso vos estão seladas.

Então, acenou-lhes e planou para o jardim, acompanhado dos seus comandados. Dado isto, em um único instante, o Éden desapareceu como se nunca antes tivesse existido. Assustado, o homem deixou a esposa e correu em sua direção, mas o jardim não era mais palpável. Sim, estavam sós. Completamente sós, em um mundo imenso e desconhecido. O pesar tomou-lhes o coração. Sentaram-se no desolado deserto em que se encontravam, tanto física como mentalmente. Havah tinha medo.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Fuga Ingênua

Bem, esse é o meu quarto conto escrito. Foi posto posto no papel em fins de 2007 e passou pro pc no começo deste ano. É um conto bacana, de que gosto bastante, apesar de simples. Tive como base uma história real que aconteceu comigo e daí fantasiei em cima. Espero que gostem.


Fuga Ingênua

Esta é uma história muito antiga e um tanto triste que me marcou profundamente. Naquele tempo eu era jovem e inexperiente. Hoje – creio eu – já sou mais sensato.

Naquela fatídica manhã foi que tudo aconteceu. Eu ainda morava na casa de meus pais e eles me traíram. Papai disse que ia trabalhar: mentira; devia estar era morrendo de remorso. Foi mamãe quem me levou. Eu era inocente. Acreditei nela. Logo chegamos ao endereço: um edifício baixo de cores alegres nos fundos da igreja. Como um estabelecimento tão pérfido poderia se encontrar nas proximidades da casa de Deus? Na porta, mamãe me dirigiu um olhar afetuoso e disse que tínhamos que entrar. Eu não compreendi, mas obedeci. Era de fato muito obediente.

De mãos dadas com minha genitora adentrei por cerca de três corredores até chegar à sala, à maldita sala. Lá, uma senhora nos esperava. Tinha cabelos brancos e escondia sob a alva tez uma maldade sem fim. Quando atravessei o limiar do cômodo senti que meus dedos não mais tocavam os de minha matriarca. Olhei para trás: a porta estava fechada. Olhei para a frente: uma senhora me sorria com desdém. Minha primeira reação foi tentar abrir a porta, mas a senhora tinha uma força descomunal para mim. Tomou-me pela mão e colocou-me em meio a outras pessoas de situação idêntica à minha. Todos chorávamos – pesarosos.

Então, começou a tortura: frases sem sentido, instrumentos de opressão travestidos de objetos de prazer... Coibiam o relacionamento entre os prisioneiros, dizendo que estávamos brigando... O próprio alimento que nos davam era uma papa entorpecente e a bebida reduzia-se a água.

A porta continuava fechada. Olhava para ela constantemente na esperança de que minha mãe aparecesse e me resgatasse. Tive a impressão de ouvi-la lamentar quando se foi. Preso naquela espécie de hospício, permaneci por horas a fio. Foi então que o destino que me sorriu: a porta se abriu lentamente. Uma outra funcionária do estabelecimento entrava na sala para falar com a que me vigiava. Rezei para que ela fosse descuidada e não trancasse a entrada totalmente. Deus me atendeu. Foi a minha chance.

Pus-me a sair pela fresta deixada tolamente e corri como um louco. Má sorte: as duas empregadas me viram sair e partiram em minha direção. Os outros prisioneiros – atordoados e seriamente vitimados pelos métodos escusos a que foram submetidos – permaneceram onde estavam. Eu, por minha vez, já ganhava o segundo corredor ao descer uma rampa. Das duas perseguidoras, a que me vigiava já desistira: era mais bem mais velha que a outra e minha agilidade não fora tão debilitada pela maldade alheia. A outra, porém, se encontrava em meu encalço.

Como era muito menor que minha inimiga, me livrava com mais facilidade dos obstáculos do caminho. Além do mais, estava com uma tremenda sorte: ao sair do último corredor e alcançar a saída, ela estava aberta. Empolgado, porém, esqueci-me da escada a seguir, que dava para a rua. Tropecei nos degraus e caí.

Os ferimentos físicos foram poucos, mas os da alma eram gigantescos.

Falhei.

Logo, mamãe chegou. E eu fui embora. Todos os dias, entretanto, voltava àquele antro de perdição.

Tinha dois anos e tentara fugir da creche, sem sucesso. Meus sonhos de virar espião da Interpol tinham ido por água a baixo. O lance era virar escritor amador mesmo.

No princípio...

Finalmente o MTP!

Já estava com esse projeto do blog há um bom tempo (mesmo). Já tinha aberto a conta, esquecido a senha, lembrado de novo e agora me vi aqui, pondo a idéia em prática. Escrevo coisas e crio histórias desde que me entendo por gente, mas foi há uns dois anos que comecei a levar a coisa de um jeito mais maduro. Desde então, tenho mantido contato via internet com pessoas de situação idêntica a minha e vejo o quanto é importante ouvir as críticas de outras pessoas. Pra isso, surgiu o blog.

Aqui serão expostos basicamente contos, histórias curtas que crio sem ter nenhuma relação (aparente) com tramas maiores, mas que ajudam muito no meu crescimento como escritor. No começo, pensei em postá-los na ordem em que foram escritos, pra mostrar minha evolução. Depois, desisti. Agora não sei mais. Vou postar como bem me der na telha. De qualquer modo, não produzo de um jeito muito lógico, então há uma boa chance de se passar um longo tempo sem textos aqui e num tempo curto surgirem vários. Faz parte da vida. Os marcadores estão aí praqueles que preferirem ler de acordo com o gênero do conto. Para as postagens não-literárias, como essa, usarei o marcador "Não-Ficção".

Bem, é isso. Espero que gostem. Àqueles que desejam me acompanhar nessa jornada, não tenham medo: farei de tudo para que a viagem seja a melhor possível. E, por favor, munam-se de comentários!

A propósito, a Terra Paralela é minha cabeça mesmo e os manuscritos são os textos, que geralmente começo no papel, pra depois revisar no pc.